quarta-feira, 27 de maio de 2009

Caderno de Poesias 1 - Cassiano Ricardo



Metamorfose

Meu avô foi buscar prata
mas a prata virou índio.

Meu avô foi buscar índio
mas o índio virou ouro.

Meu avô foi buscar ouro
mas o ouro virou terra.

Meu avô foi buscar terra
mas a terra virou fronteira.

Meu avô, ainda intrigado,
foi modelar a fronteira:
E o Brasil tomou forma de harpa


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Relógio de Pêndulo
Nada melhor do que um relógio antigo
pra quem cultive a graça das demoras.
Um relógio que, por absurdo e ambíguo
marque mais os outroras que os agoras.

Um monstro tardo, não obstante assíduo,
que acuse mais os anos do que as horas.
E mais viva atrasado no castigo
que a me indagar na pressa: por que choras?

O que mandei comprar a um velho avaro
é assim - memória no desassossego.
Gorjeia às vezes mais do que um canário.

Relógio sub-reptício que (morcego)
chupa o meu sangue mas, em cada brecha,
as asas dos ponteiros abre e fecha...
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A Física do Susto

O espelho caiu da parede.
Caiu com ele o meu rosto.
Com o meu rosto a minha sede.
com a minha sede o meu desgosto.
O meu desgosto de olhar,
no espelho caído, o meu rosto.

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